Os Padrons de Belo Horizonte têm causado estranheza pelo fato
de serem encarroçados com chassis 'de motor dianteiro'
Infelizmente esta dúvida do título acima está presente em
muitos entusiastas brasileiros, sendo que muitas das vezes as respostas estão
sujeitas à muitos mitos.
Para não haver muitas delongas, as principais vantagens de
um ônibus urbano com motor montado verticalmente, centralizado e longitudinalmente
sobre o balanço dianteiro em relação ao mesmo montado sobre o balanço
traseiro seriam:
A posição para acesso à região do cabeçote do motor --- no ‘dianteiro’
o mecânico apenas levanta o capuz, ou cofre, do motor conseguindo visualiza-la
perfeitamente. No ‘traseiro’ há certa dificuldade por causa da plataforma
traseira onde estão os assentos, sendo necessário o desaparafusamento de algumas tampas . No caso até poderíamos colocar um capuz no lugar delas, mas
além da perda de assentos e espaço interno, o ruído e calor do motor poderiam
ser mais incômodos e a solução para estes problemas seria onerosa.
Motor montado, verticalmente, longitudinalmente
e centralizado, no balanço dianteiro
Motor montado, verticalmente, longitudinalmente
e centralizado, no balanço traseiro
O ângulo de saída --- no ‘dianteiro’ o ângulo de saída pode ser maior mesmo que o balanço traseiro seja longo em relação ao ‘padrão comum’, já que não há um motor instalado ali. No caso do ‘traseiro’ esse ângulo é menor, e os mecanismos para aumenta-lo são complexos, onerosos e às vezes, até inviáveis.
As tensões na estrutura próximo aos eixos --- no motor ‘dianteiro’, o formato do espaço útil no balanço dianteiro é um ‘L’ longitudinal invertido , pois na lateral está o motorista, que permanece sentado durante todo o percurso . Logo entre a porta e o motorista pode-se instalar um motor com cilindros verticais, de forma centralizada. Além disso, há outra vantagem crucial: por causa da geometria desse espaço o motor pode ser recuado para o eixo dianteiro ‘distribuindo melhor’ as tensões na estrutura da região próxima aos eixos dianteiro e traseiro. Isto gera ainda outra vantagem pois, o formato do espaço útil no balanço traseiro é um “L’, e sem o peso de um motor instalado nesta posição, este (espaço) pode ser 'alongado' , preservando o já 'aberto' ângulo de saída, sem prejuízo à estrutura, desde que estes obedeçam determinados parâmetros. Assim aumenta-se a capacidade para transportar mais passageiros.
Entretanto o passageiro é que sofre, se não houver suspensão à ar, já que o peso do ‘motor dianteiro’ aumentará os solavancos na outra extremidade do chassi.
Espaço 'L' longitudinal invertido, motor mais próximo do eixo e balanço traseiro alongado
em um chassi com 'motor dianteiro'.
No caso dos modelos
com ‘motor traseiro’, o motor montado centralmente não pode invadir demais o espaço útil em ‘L’ transversal invertido e por
isso este é montado mais afastado do eixo traseiro merecendo um cuidado maior e oneroso
nas tensões que se aumentarão na região sobre ele (eixo), por causa do peso do propulsor . A razão deste ser mais afastado é
porque precisamos do corredor e espaço para o passageiro ter acesso à porta. Se
avançarmos o motor para o eixo traseiro, este invadirá o espaço para a porta,
além de ocasionar também a perda de espaço interno, deixando esta área esteticamente
feia e inconveniente, já que o mesmo se tornará um “U’ invertido.
Espaço 'L' transversal invertido, motor afastado do eixo por causa do acesso à porta e balanço traseiro 'normal' em um chassi com 'motor traseiro'.
Outros problemas que tornam o ‘motor dianteiro’ mais
vantajoso no Brasil.
Caio Vitória com chassi Mercedes OF1318 - 'motor dianteiro'com 6 litros
Infelizmente, exceto para os técnicos envolvidos na área de transportes, alguns
acontecimentos nos últimos anos ajudaram a demonizar ainda mais o ‘motor
traseiro’, quanto a sua praticidade. Inclusive até mesmo boa parte de nós, entusiastas, ainda cai nesses
mitos porque misturamos 'modernidade imaginária' com a realidade ou porque somos indiferentes à última.
Isto ocorre porque boa parte dos ônibus urbanos brasileiros
têm ou tiveram chassis da Mercedes com motores compactos, mais econômicos e com
mecânica pouco complexa montados na dianteira, já que culturalmente damos preferência
aos resultados imediatos que os de longo prazo. Assim não importava que o
ônibus tivesse motores que trabalhassem em altas rotações, e que durassem ‘á
revelia’, desde que mecânico resolvesse o problema, e o ‘carro voltasse a rodar’.
Logo, motores que demorassem a ‘pedir manutenção’, mas que esta, naquele
momento, fosse onerosa, não era vantagem. Outra desvantagem é que nos percursos
urbanos com muito ‘para e arranca’, motores mais robustos podem ser
desvantajosos se o peso bruto do chassi for baixo (caso comum nos urbanos), já que comprometem o lucro
do empresário com o alto consumo de combustível de forma desnecessária.
Caio Vitória com chassi Scania L113 - motor traseiro com 11 litros
Assim, boa parte de nós, temos a cultura de que o ‘motor traseiro’
é potente e beberrão e o motor dianteiro é econômico, mesmo que o chassi
OH1621L e o OF1721 tenham utilizado o mesmíssimo motor (srssr). Talvez isto
ocorra porque a Scania e a Volvo sempre forneceram chassis com motores potentes
e fortes que trabalham em baixa rotação, e devido a sua litragem maior, têm
ruído mais grave (muita das vezes cálido) e agradável aos nossos ouvidos em relação
aos estridentes motores ‘sob medida’ da fabricante alemã.
Outro problema mais grave é a falta de intervenção do poder
público a nível federal para a criação de soluções mais em conta. No caso já tivemos
chassis mais simples com ‘motor traseiro’, e até temos fabricantes que ainda os
fornecem, mas como não são obrigatórios, boa parte das administradoras de
transporte não os adquire justamente porque não são obrigadas, mesmo que o
trajeto das linhas administradas permitam veículos com esta configuração.
Esta falta de interesse torna o problema uma bola de neve valorizando
ainda mais o ônibus com ‘motor dianteiro’ porque a fabricante não irá investir
no segmento de ‘motor traseiro’, tornando a sua aquisição impopular, cara e
com alta desvalorização de preço para revenda. Desta forma, temos no Brasil uma
sensação de ‘polaridade’, onde traseiro é só para Padrons de ‘cidade grande’ e
os ‘dianteiros’ para as más condições das estradas brasileiras. Contudo o nosso
pensamento não deveria ser tão imediatista e sim para resolvermos o problema
das estradas ou dos ônibus visando resultados de longo prazo, e não
estacionarmos neste (problema).
Neobus Mega Plus Mercedes OF1519 - Motor Dianteiro
Com a obrigatoriedade de aquisição, as fabricantes
investiriam em produtos melhores, e os custos de manutenção diminuiriam, por causa
da ampla concorrência e maior publicidade de informações e mão de obra
especializada. Então o feitiço ‘viraria’ contra o feiticeiro, pois o ‘motor
dianteiro’ seria o menos popular, já que os percalços para a aquisição e
manutenção seriam mais inconvenientes que as suas vantagens naturais.
Alguns exemplos interessantes de modelos ‘meio termos’ são
os chassis Mercedes OH1621 Euro V e Volvo B5TL Euro VI. No caso ambos atendem alguns
anseios de administradoras, que são clientes diretos da fabricante, e aos dos
passageiros - que são clientes diretos do administrador e indiretos da
fabricante.
Neobus Mega Plus Mercedes OH1621L- 'motor traseiro'.
A sua carroceria se torna mais atraente 'com motores traseiros'
O OH1621L Euro V possui o mesmo motor que o OF 1721 Euro V
sendo o consumo bem aproximado do seu ‘irmão’ com motor dianteiro, que ‘bebe um
pouquinho mais’. O câmbio manual também é o mesmo assim como os eixos, sendo
opcionalmente possível até terem o mesmo tipo de suspensão (no caso a metálica).
Embora não tenha câmbio automático, só o fato de um motor mais leve que o predecessor
OM366, ser instalado no balanço traseiro, já traz uma qualidade de trabalho
para o motorista e outra apresentação visual para o passageiro, pois devido as
características de encarroçamento para atender as especificações do chassi, o
modelo se torna muito mais atraente interiormente e exteriormente.
Wright Gemini Volvo B5TL - 'motor traseiro'. Solução com motor à diesel
compacto para problemas de custos com híbridos, enfrentados
por algumas administradoras do transporte público britânico
Já o Volvo B5TL foi muito mais longe: ele praticamente atende
os mesmos requisitos do extinto, mas moderno, B9TL, exceto o motor que é mais fraco. Desenvolvido
para o mercado britânico, esse chassi utiliza um econômico motor ‘ 5,1 litros’
de 4 cilindros, mas que dispensa 240cv de potência e tem desempenho superior ao
motor com 6 cilindros utilizado nos
OF1724 Euro V.
Finalizando, o ‘motor dianteiro urbano’ é bom para o
administrador (por causa do baixo custo de aquisição, manutenção e boa revenda),
mas ruim para as pessoas que estão dentro do veículo. Já o ‘motor dianteiro
rodoviário’ pode ser ruim para o administrador, pois a concorrência e remuneração da prestação de serviços
são diferentes em relação às linhas urbanas, e uma configuração deste tipo pode
trazer uma imagem externa ruim (para os serviços prestados). Também temos o
problema das viagens de longa distância que podem exigir motores maiores e
pesados, mas que trabalham em baixas
rotações e conseguem mover um peso bruto de mais de 25 toneladas, mantendo o
padrão de conforto exigido pelo passageiro. Assim para otimizar o espaço
interno, é mais conveniente coloca-los no balanço traseiro, que por sinal é
mais curto na maioria das vezes em relação aos urbanos.
Referencias e agradecimentos : Manual para encarroçamento de
chassis MAN, Equilíbrio (Curso de Física Volume II), Prospectos da Mercedes,
Volvo, Scania e MAN, OCH Fotolog, e Mercado Livre.